quarta-feira, janeiro 11, 2006

Camuflagem

Conhecera-a através de um grande amigo, de início não simpatizara com ela, mas após encontrá-la várias vezes, passou a até querê-la bem e a considerá-la no rol dos amigos prediletos.

O tempo foi passando e ele foi ficando cada vez mais admirado com a pessoa que se apresentava cada vez com mais freqüência em sua vida. Algumas pessoas que conhecemos, depois de um certo tempo, desaparecem de nossas vidas, - pensou. Porém, ela estava cada vez mais presente, às vezes até a coincidência ajudava. Na mesma hora, no mesmo local, lá estavam, se encontrando por obra do acaso. Do acaso sim, do destino, nem pensar. Não gostava da palavra destino, não acreditava nela, na palavra.

É certo que muitas vezes encontrava contradições entre palavras e atos nela, mas quem é perfeito? Num determinado momento, quando a vida quis dar-lhe uma lição por sua maneira de ser, lá estava ele a defendê-la, vendo sempre o lado bom de sua pessoa, das suas intenções, era assim que ele era, um amigo incondicional.

Mas quem disse que a vida é uma linha reta? Sua próxima descoberta foi perceber que às vezes ela o interpretava mal, provocava uma paixão onde não existia, e buscava ir além. Sua primeira idéia foi de conversar com ela, demonstrar suas intenções, deixando claro que era tão e somente amigo, nem mais. E como bom e preocupado amigo que era, ele continuava observando, e para sua surpresa crescente algo foi se transformando no seu jeito de vê-la. Finalmente parou, por um instante, e viu a revelação que se fazia.

Ela era uma atriz. A perspicácia com que estudava as pessoas era impressionante. Procurava agradar gregos e troianos, como que se não tivesse opinião, vida, moral, amor próprio. Alcançava o êxtase quando se via rodeada de pessoas a admirá-la. Chegava a ser ridícula e exagerada de tão exacta que era em concordar e discordar sobre o mesmo assunto, com pessoas diferentes, apenas para seguir ideologias distintas.

Ele perguntava-se se ela mesma não se incomodava com tanto artificialismo, com tanta superficialidade. Sua forma era cada vez mais abstrata, esperava vê-la qualquer dia a falar com uma lajota, só para no fim do monólogo, ela ter a comum e incrível sensação de prazer que ela já há tanto conhecia: a de que falou por último e não foi retrucada.

Sua originalidade já nem mais existia. Ele, nem de longe, conseguia sentir aquela essência na pessoa dela de quando a conheceu. Ao contrário, estava decepcionado. Son ami était une poupée, une marionnette.

Ficou bravo com sua descoberta. Quis castigá-la, rechaçando suas investidas comuns e sendo indiferente às coincidências que há muito se tornara pathétiques.

Sabia que não podia se igualar. Não queria ser comparado com aquela criatura, nem hoje, nem amanhã. Refletiu na situação. Precisava ser frio, racional e decidiu que havia ainda uma saída, uma esperança.

Foi então nesse momento que o telefone tocou e veio a notícia, ela se suicidara.

-smallville-